Nós, de Mossoró, temos sim um recalque que é totalmente explicito.
Por que Mossoró não é Tibau ou por que Tibau não é Mossoró.
É recalque, sim. E não diga que não.
Faço-lhe agora mesmo algumas perguntas e depois que me responder ai conversamos novamente:
Por que não construíram a Catedral de Santa Luzia ali, onde fica a igreja de Santa Terezinha, em Tibau? Não vai ai, pelo amor de Deus, nenhum preconceito a Santa Terezinha, por favor!
Por que Antonio de Souza Machado e sua esposa não andaram mais um pouquinho e foram ver o mar? Já que para aquelas bandas tinham as charqueadas de Grossos, tinham os morros de areia colorida, tinha peixe, tinha toda condição de criar gado.
Por que?
Sei que se eles tivessem feito isso, talvez nós, de Mossoró, não tivéssemos tanto orgulho da luta heróica que nossos antepassados travaram com o bando de Lampião. Até porque, talvez eles nem fossem bater para aqueles lados.
Mas, e daí? Teríamos tantas outras coisas para nos orgulhar.
Digo que é recalque, porque nós, de Mossoró, somos tão tibauensses quanto qualquer pescador, qualquer nativo. Nós de Mossoró, não temos nossa história fincada apenas naquela terra quente e maravilhosa do oeste potiguar, temos os sonhos, aspirações, desejos daquelas pessoas simples e pacatas de Tibau. Queremos o melhor pra aquele povo, porque aquele povo somos nós.
Não importa se nós, de Mossoró, temos ou não casa de veraneio, temos ou não carro para nos deslocarmos para lá, se temos ou não dinheiro para gastar na praia. Não importa nada disso, porque Tibau também é nossa.
Se não fosse assim, por que no dia primeiro de janeiro de cada ano aquela cidade mais parece um formigueiro humano?
Se não fosse assim, por que mesmo reclamando de falta de segurança, de falta de limpeza, nossas casas estão sempre arrumadas e prontas para nos receber a cada feriadão?
Fico pensando em como nos definir, se mossorotibauensses ou tibaumossoroensses. E a dúvida continua.
Nós, aqui de casa, somos assim, ficamos meio bobos, tolos, preguiçosos, desarrumados, sorrindo a toa, brincando, viramos criança, dançamos, encontramos os amigos, a família. Ficamos enamorados, mesmo estando sozinhos. Ficamos apaixonados, querendo o dia de lua cheia, quando a maré enche e bate nos paredões das casas, esperando as ondas voltar e ver o V que os tatuís fazem na beira do mar, ver os caminhos que as marias-farinhas fazem para depois se esconder nos buraquinhos pelo chão.
Alguns de nós surfam, outros dormem ou jogam buraco.
Alguns de nós, se produzem para celebrar a noite, outros sentam e tomam café com pão carteira as três horas da tarde. E segundo Virginia, uma prima, não existe em lugar nenhum do mundo, pão carteira igual aquele.
Sei que só conseguimos fazer isso durante trinta dias no ano, mas faz ou não faz parte de nossa história? Como podemos desprezar, esquecer esse punhado de emoções e experiências?
E ai, é recalque ou não?
Somos ou não somos tibaumossoroensses? rsrsrs
Tenho uma tia que brinca e diz que parece que jogou o cordão umbilical dos filhos no mar de Tibau, pois eles não se desprendem nunca de lá. Pois eu lhes digo mais, acho que todas as nossas mães e nós também, enquanto mães, fizemos a mesma coisa, porque andamos, viramos o mundo de cabeça para baixo, mas sempre voltamos, sempre achamos que não existe banho de mar igual aquele; não existe omelete igual ao de Fátima de Fabiano; não existem garrafas de areia colorida iguais as da finada Josefina; não existe sol como aquele, que esquenta, mas não torra, que aquece, mas não incomoda; que não existe uma rua mais concorrida que a rua do Brisa e é por isso que chamamos Tibau de Paraíso dos Inocentes; que não existem citações mais belas que as de Coconha, pintadas nos muros das casas; que não existe um cenário mais belo que aquele da entrada.
Não, não ali no Gancho!
Você entra mais um pouquinho como se fosse para o centro e ai aparecem os coqueiros, os morros, os telhados das casas, o mar, o Porto Ilha.
É, sim! É exatamente ali onde você começa a sentir a brisa, o cheiro de Tibau.
Uma mistura de sol, mar, bronzeador, protetor solar, de peixe assado, de grude, de cocada, enfim, é o cheiro de lá.
Cheiro que sinto várias vezes no ano. Quando estou muito cansada da vida da cidade grande, de repente sinto o cheiro de Tibau e, às vezes, até olho para os lados, mas não tem ninguém. Acho que meu organismo achou uma forma de se defender da loucura e do stress e leva de volta ao paraíso o meu espírito já cansado.
Tibau de Todos os Tempos, de Lúcia Rocha. Pedidos pelo Whatsapp 84 9668.4906 |